Wilson Simonal:
Dedo-duro ou vítima da esquerda?
A turbulência política, social e artística, no Brasil, na segunda metade dos anos 60 e no inicio da década de 70, do século passado, está de volta ao noticiário com o lançamento do filme Ninguém sabe o duro que dei (dirigido por Cláudio Manoel Micael Langer e Calvito Leal, que focaliza o sucesso e a tragédia na vida de um dos maiores cantores da época: Wilson Simonal (1935/2.000).
O mundo começou a desabar para Simonal por conta de um episódio controvertido, em1971. O artista desconfiado de que o seu contador, Rafael Viviani, estava lhe roubando (ele ganhava muito dinheiro e fizera um contrato de patrocínio com a Shell - o maior do Brasil, naquela época), chamou policiais civis do Dops (Departamento de Ordem Política e Social – órgão repressor da ditadura militar - 1964/1985), para aplicarem uma surra no suposto ladrão. Denunciado à polícia pela vítima, o próprio Simonal foi detido por 12 dias e apontado como “informante do Dops”.
Foi o bastante para que alas da ideologia de esquerda contrária a ditadura militar, implantada no País, a partir de 1964, encravadas no meio jornalístico e no artístico, começasse o desmonte de uma carreira, consagrada, até então, na música popular brasileira. Ao praticar o desastrado sequestro, e apontado como “informante do Dops, Simonal morria duas vezes, a primeira, artística, e a segunda quando faleceu anos depois. Passou a ser considerado um dedo-duro no meio artístico, a serviço da ditadura.
O Pasquim, o mais influente jornal de oposição à ditadura, não dava tréguas a Simonal, comandando uma campanha destruidora contra o cantor. O personagem Caboclo Mamadô, do cartunista Henfil, sepultava artistas ligados, direta ou indiretamente, ao regime, e a caricatura de Simonal sempre aparecia com o S do seu nome com o sinal de cifrão. Em outro cartoon, era desenhada a mão de um homem com o indicador, negro, esticado e com o texto: “Como todos sabem, o dedo de Simonal é mais famoso do que sua voz. A propósito: Simonal foi o cantor brasileiro que fez muito sucesso no país ali pelo final da década de 60”.
Cantores famosos ligavam para casas de shows, condicionando apresentações a não contratação de Simonal. Diretores de programas de televisão deixaram de convidá-lo. Um massacre. Um exilado dentro do seu próprio país, e o pior, impedido de trabalhar. A carreira gloriosa acabava ali. Virou alcoólatra, e até é morrer, traumatizado, o artista, perseguido, ficou 37 anos no ostracismo, sem cantar, vender disco. Todas as portas fechadas.
Por que tanto ódio e inveja? Por que tanta carga de preconceito tão arrasador por parte esquerda? Só por que ele era negro, rico, fazia sucesso estrondoso, e não tinha discurso político (aliás ele era oco de qualquer ideologia) afinado por aqueles opositores da regime vigente? Ou porque não era do time dos tropicalistas, e não cantava música de protesto?
Nunca foi provado que ele denunciava colegas de profissão. Em 2003, a pedido da família, a Secretaria Nacional de Direitos Humanos informou que não existia nenhuma prova de que Simonal tivesse servido à ditadura. Até a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) o reabilitou simbolicamente.
Com seu carisma, swing, ele sacudia multidões (certa vez ele cantou, no Maracanãzinho para uma platéia de 30 mil pessoas, quando naquele tempo os cantores só lotavam boates e teatros). Só perdia em popularidade para Roberto Carlos, no auge da Jovem Guarda.
Seus ferrenhos detratores de esquerda, o acusavam, também, de “vendido” às multinacionais, por conta de um contrato milionário que fez com a Shell, para posar como garoto-propaganda e ajudar a popularizar o Mug, um boneco que ganhou fama de ser o talismã, nos anos 60. Ora, ora,
Chico Buarque também foi contratado pela Sheel para aparecer em capas de revista abraçado com o Mug. Ninguém abriu o bico para criticá-lo.
Simonal, e outros cantores da época, como Roberto Carlos, eram marginalizados pela “intelectualidade nacional” por não fazer parte da MPB. Pois, suas composições e de outros intérpretes populares não eram criadas se sustentando em metáforas, imagens truncadas e herméticas. Pois tal artifício de linguagem era utilizado por compositores engajados contra a ditadura, para driblar a censura, a partir de 1968 com o decreto do famigerado Ai-5 (13 de dezembro). A praia dele era outra, o gênero da pilantragem, como costumava dizer.
Simonal, e outros cantores da época, como Roberto Carlos, eram marginalizados pela “intelectualidade nacional” por não fazer parte da MPB. Pois, suas composições e de outros intérpretes populares não eram criadas se sustentando em metáforas, imagens truncadas e herméticas. Pois tal artifício de linguagem era utilizado por compositores engajados contra a ditadura, para driblar a censura, a partir de 1968 com o decreto do famigerado Ai-5 (13 de dezembro). A praia dele era outra, o gênero da pilantragem, como costumava dizer.
A “MPB, como afirma Paulo César de Araújo, em seu livro Eu não sou cachorro, não, "mais do que um gênero transformou-se, a partir do fim dos anos 60, numa verdadeira instituição, dotada de reconhecimento cultural e de lugar social bem determinado. Apesar do aparente significado, a sigla MPB não representa toda e qualquer música popular produzida no Brasil. Ainda hoje, e de uma maneira muita mais intensa no período do regime militar, ela é a expressão de uma vertente da nossa música popular urbana, produzida e consumida majoritariamente por uma faixa social de elite, segmento que a indústria cultural classifica como público A e B”.
Simonal era, na essência um cantor de música popular.
Simonal era, na essência um cantor de música popular.
Era assim, uma espécie de Garrincha da música: a alegria do povo.
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