19 de jun. de 2009

17/06/2009 - 13:06

Carta aberta ao presidente Sarney

Caro presidente José Sarney,

Pensei em várias formas de comentar a crise do Senado e o seu discurso-desabafo de terça-feira. Perdoe-me a petulância, mas não encontrei outro jeito melhor de dizer o que penso e sinto sobre tudo isso do que escrevendo-lhe esta carta aberta.

Sei que ainda sou muito jovem para dar conselhos a um ex-presidente da República próximo de completar 80 anos, o que não me impede de usar este espaço público para apresentar-lhe uma sugestão diante do impasse vivido pelo Senado.

Escrevo-lhe porque lhe quero bem, testemunha que sou da maneira lhana como sempre tratou os jornalistas. Posso imaginar o drama pessoal que está vivendo, no olho do furacão político, bem no momento em que a sua filha enfrenta os desafios de mais uma delicada cirurgia.

Chegamos, porém, a um ponto da degradação das práticas parlamentares em que já não bastam discursos, remendos, providências de emergência, costurar acordos de cúpula, demitir meia dúzia de funcionários ou chamar a Fundação Getúlio Vargas para corrigir as distorções mais evidentes.

Concordo que a crise não é somente sua, presidente Sarney, mas do Senado, como o senhor disse na parte central do seu discurso, embora este já seja seu terceiro mandato à frente da Casa, sempre com plenos poderes.

Exatamente por isso, ao contrário do que pensam alguns colegas meus, não acho que a sua simples renúncia neste momento seja capaz de dar um fim à crise e restabelecer a credibilidade do Senado junto à opinião pública.

Fomos tão longe nesta triste sequência de denúncias sobre desmandos e privilégios inadmissíveis, que agora já não se trata de encontrar um ou meia dúzia de culpados. O problema é o conjunto da obra e o tamanho do estrago na imagem da instituição.

Diante disso, presidente Sarney, proponho a renúncia coletiva da mesa do Senado e a convocação de novas eleições no menor prazo possível.

Esta nova eleição deveria ser baseada numa carta de princípios em que todos os candidatos a membros da Mesa, começando pela presidência, se comprometam a restaurar princípios básicos de moralidade no uso dos recursos públicos.

Depois de 60 anos de vida pública em que o senhor ocupou todos os cargos possíveis na República, creio que este gesto não seria entendido como fuga à responsabilidade nem como fraqueza diante da gravidade da crise.

Ao contrário, será talvez o gesto de grandeza mais nobre da sua carreira que se confunde com a redemocratização do país.

De nada adianta agora discutir ou rebater cada uma das denúncias feitas a senadores e funcionários da Casa, como deixou bem claro seu melancólico discurso da tribuna em que chegou a afirmar: “É injustiça do país julgar um homem como eu, com tantos anos de vida pública”.
Injustos podem ser os homens, não o país, que tem todo o direito de julgar qualquer um de nós, independentemente da antiguidade ou do posto que ocupamos no momento.

Ao lhe prestar solidariedade esta manhã, ainda em meio à sua viagem ao exterior, o presidente Lula também foi infeliz ao dizer que o senhor “tem história no Brasil suficiente para que não seja tratado como uma pessoa comum”.

De acordo com o que diz o nunca demais lembrado Artigo 5º da Constituição Federal, “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (…)”. Somos todos, portanto, pessoas comuns.

Por isso, a melhor resposta que o senhor poderia dar neste momento a todos os que o acusam é justamente abrir mão do poder, junto com seus pares do comando do Senado, abrindo caminho para que a instituição possa encontrar um novo começo.

Em respeito à sua própria biografia, caro presidente Sarney, penso que quanto mais durar esta agonia do Senado, que o atinge tanto no campo pessoal como no político, pior será para o senhor e para a instituição que representa.

Com estima e respeito,


Ricardo Kotscho

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