2 de jul. de 2009

Caro Sr. Leonel Tafareo, superintendente do Pátio Brasil Shopping [em Brasília]:
Sou o pai do jovem Pedro Lucas, um rapaz íntegro e cheio de esperanças que recentemente tirou sua vida no Pátio Brasil. Está sendo muito difícil escrever esta carta, principalmente neste momento em que a dor, saudade e sentimento de perda ainda se fazem presentes. Mas são esses mesmos sentimentos, acrescidos do sentimento de indignação, que me moveram a escrever esse manifesto.
Fico a me perguntar quantos pais, amigos ou familiares das vítimas do shopping Pátio Brasil tiveram coragem de falar o que pensam, de reclamar os seus direitos de respeito e segurança, de expor a sua dor. Talvez poucos ou nenhum... Eu sei que nada trará o meu filho de volta, mas quem sabe esse meu ato possa preservar mais vidas e trazer mais respeito e consideração àquelas que já se foram.
Meu caro senhor, antes de acontecer com meu filho já sabia que o suicídio era uma prática corrente no shopping, já ouvira vários casos: de uma mulher grávida, uma senhora, vários garotos... Não imaginava que era tão comum até acontecer com alguém do meu mais profundo íntimo. Outro dia, através de conhecidos, soube que a estatística de suicídios no shopping apresenta o número médio de 12 (doze) por ano, ou seja 01 (hum) por mês! Meu Deus, quantas pessoas já se suicidaram lá e ninguém fez nada?!
Bem, até que já fizeram, pois o pessoal está treinado. A rapidez em isolar a área, cobrir as vítimas com um plástico preto e acionar a perícia é admirável. Eles são mais rápidos ainda em acobertar os fatos. Por que ninguém fala sobre as mortes?
Esse silêncio absoluto eu comprovei pessoalmente. No último sábado, dia 14 de março deste ano, visitei o shopping, o lugar onde meu filho pulou, onde ele caiu. Entrei em uma loja aleatória, fingindo ser um comprador comum. Quando discretamente perguntei do acidente, as atendentes fizeram cara de censura. “O pessoal faz a maior pressão para não comentarmos nada”, disse uma delas.
É clara e absurda a política do “pessoal” fazer as pessoas calarem, fazer as pessoas esquecerem logo o que aconteceu para não prejudicar as vendas, o lucro do Pátio Brasil. Aliás, do jeito que as coisas andam, por que ninguém ainda teve a brilhante idéia de abrir uma funerária no shopping, é dinheiro na certa.
O “pessoal”, a administração do shopping, também não quer nenhuma relação com os familiares das vítimas, pois ninguém, nenhum empregado do shopping, nem mesmo o senhor superintendente ou outro gerente do Pátio Brasil deu algum amparo a mim, à minha esposa, à mãe de meu filho; nem um telefonema, carta, ou aperto de mão. Quanta frieza!
A mídia também não faz alarde, o que, por um lado, considero positivo, pois a coisa fica menos banalizada. Por outro lado, ninguém fica sabendo dos inúmeros suicídios, fica como se nada tivesse acontecido.
Mas a banalização das mortes no shopping é inevitável, é um problema da nossa realidade. O suicídio no shopping virou espetáculo rotineiro, a que vários curiosos querem assistir, fotografar e até filmar a queda como se fosse a coisa mais comum do mundo.
Antes de o Pátio Brasil virar o lugar comum para os suicídios em Brasília, a Torre de TV era procurada para esse fim, até que, por respeito à vida humana, colocou-se lá grades protetoras para impedir que pessoas psiquicamente doentes, no momento maior dos seus desesperos, dali saltassem. Por que ainda o Pátio Brasil não tomou esta providência? Esperando o quê? Qual a maior preocupação da direção desse shopping?
A solução é simples: uma grade, rede ou tela de proteção, vidro ou até mesmo um parapeito mais alto resolve. O parapeito do lugar de onde meu filho saltou tem apenas 1,20m de altura, já é um risco para qualquer adulto, imagine para uma criança que inocentemente brinca! Eu tenho certeza que essas medidas não prejudicariam a estética ou o lucro do local.
Aquele sábado foi minha última visita ao shopping macabro. Minha família, meus amigos e a todos que eu puder passar essa mensagem tenho certeza que pensarão duas vezes antes de visitar o shopping Pátio Brasil.
Para concluir, senhor superintendente, saiba que o seu shopping, dada à insegurança e facilidade de pular, já é referência em estudos sobre suicídios, como o lugar mais procurado para esta prática, infelizmente.
Por fim, gostaria de colocar que o shopping deve ser um lugar alegre, que cultive a vida, e não a morte.
Como Vossa Senhoria pode imaginar, os familiares e eu especificamente me sinto com o acontecido. Assim, conforme já lhe disse pessoalmente em nossa conversa na data de 30/03/09, é imperioso que a fita (ou DVD) de segurança na qual aparecem trechos gravados do ocorrido não seja, em hipótese alguma, mostrada para nenhuma pessoa além daquelas responsáveis pelas investigações policiais sobre o assunto. Lembro que é de inteira responsabilidade civil e criminal de vocês a guarda da fita (ou DVD) e a tomada das medidas de cuidado e segurança para que as imagens não venham a ser vistas ou disponibilizadas para quaisquer pessoas alheias ao problema.
Com relação às providências que Vossa Senhoria me assegurou que serão estudadas para prevenir eventuais novos acontecimentos, como o que vitimou meu filho, reafirmo (como já fiz pessoalmente na oportunidade em que conversamos) que dentro de 90 dias voltarei a cobrar medidas efetivas.
Marcos de Alencar Dantas
*Na última terça-feira, aconteceu mais um suicídio, no shopping Aldeota, aqui em Fortaleza.

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