13 de set. de 2010

O poeta, sábado passado, no banco da praça

Mário Gomes, o iluminado

O soneto XIII do poema Via Láctea, de Olavo Bilac, é um dos mais lindos da poesia nacional (penso). Quem de nós não fica maravilhado ao perceber:

Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muitas vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto...


E quem não se deslumbra lendo essa outra joia:

Beijei a boca da noite
E engoli milhões de estrelas
Fiquei iluminado.


O primoroso verso antropofágico não é de nenhum medalhão das letras nacionais, não.
No sábado passado tive um misto de alegria e de muita tristeza em conversar com o autor do poema Ação Gigantesca, no qual o verso acima está incluído: Mário Gomes. Na conversa que tivemos, na Praça do Ferreira, seu habitat preferido, ele me reconheceu e lembrou de uma matéria que fiz sobre a sua obra, há dois anos, para a minha revista Singular.
Até a capa da edição, o poeta, lúcido, lembrou-se, e fiquei de entregá-lo, pessoalmente, mais exemplares da revista, como ele pediu.
Porém, fiquei muito e muito triste com o estado de saúde do nosso último poeta que faz da rua, da praça, da alameda o seu encantamento. Doente, a voz quase inaudível, esquelético, uma reles sombra de gente...morrendo.
Saí da praça relembrando outros nomes de artistas cearenses (o pintor Chico da Silva foi considerado um dos quatro mais importantes pintores primitivistas do mundo, ganhou até medalha do governo do Estado, e morreu na miséria). Mário Gomes, certamente após morte será homenageado, pode ser até com uma estátua, na Praça do Ferreira ou nome de concurso cultural.
Enquanto ele vive, ao relento, remoendo suas memórias, perambulando por aí, não aparece ninguém para minimizar a sua dor.

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